UVAS MARINHAS

derek-walcott

Essa vela que se inclina para a luz,
cansada de ilhas,
uma escuna que avança para o Caribe

rumo a casa, poderia ser Ulisses,
confinado ao mar Egeu;
esse pai e marido ansiado,

sob as vinhas ácidas e nodosas, é como
o adúltero que ouve o nome de Nausica
em cada grito de gaivota.

Isto não traz paz a ninguém. A velha guerra
entre obsessão e responsabilidade
nunca acaba e tem sido sempre a mesma

para o vagabundo dos mares ou para o que na praia
agora calça as sandálias e regressa a casa,
desde que Tróia exalou a última chama,

e a pedra do gigante cego agitou os fundos
de cuja vaga os grandes hexâmetros subiram
para findar em exausta rebentação.

Os clássicos podem consolar. Mas não o bastante.

Derek Walcott, Santa Lucía, Caribe (n.1930), tradução de Soledade Santos

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Mapa do Novo Mundo

I – Arquipélagos

No fim desta frase, vai começar a chover.
À beira da chuva, uma vela.
Lentamente a vela irá perdendo de vista as ilhas;
A crença de uma raça inteira nos portos
afundar-se-á na neblina.
A guerra dos dez anos terminou.
O cabelo de Helena, uma nuvem gris.
Tróia, uma cova de cinza branca
junto do mar onde chuvisca.
A chuva retesa-se como as cordas de uma harpa.
Um homem de olhos nublados toma-a
e dedilha o primeiro verso da Odisseia .

Derek Walcott, Antilhas (n. 1930), traduzido por Nuno Dempster.

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